Gata Negra #53: Verdades e Mentiras 2/2

Gata Negra #53: Verdades e Mentiras 2/2

Último capítulo do arco Pretérito Imperfeito! Enquanto a célula da S.H.I.E.L.D. comemora a chegada de Nick Fury, Felicia vai a um encontro misterioso, em busca da derradeira verdade sobre Walter Hardy! E mais: quem é o agente duplo infiltrado na maior agência de segurança do mundo? 

S.H.I.E.L.D., Metrópolis

Todos foram pegos de surpresa. A chegada de Nick Fury às instalações da agência foi mais rápida do que a notícia conseguir alcançar todos os corredores do edifício fachada do Standard Savings of America Bank & Trust. A aeronave pousou no terraço, o coronel, escoltado, se dirigiu à Sala de Comunicações e pronto. Susto dos demais agentes desavisados.   

Cumprimentando todos com discrição, Nick Fury logo tratou de avaliar – visualmente – o modus operandi da célula comandada por Sam Hicks, homem que ele acreditava ser leal aos princípios de segurança nacional e patriotismo.   

Alguns agentes o olhavam como um ser intocável, devido a sua grande importância e história na S.H.I.E.L.D., com milhares de ações bem sucedidas em anos de serviço. E quando a voz foi solta a pergunta soou como uma ordem.   

- Onde está Sam Hicks?   

A correria tomou conta dos corredores até que o procurado chegou, esboçando um aperto de mão. Em vão.   

- Coronel Fury. É uma honra recebê-lo aqui. Sabíamos que o senhor viria, mas como não tínhamos ideia da data, não pudemos preparar uma recepção.  

- Não se incomode em relação a isso, Sam Hicks. Minha passagem por aqui será muito breve.  

- Por favor, acompanhe-me.   

Os dois caminham em silêncio até a Sala de Reuniões. A escolta do coronel ficou do lado de fora, seguindo ordens de intervenção.   

- Sente-se, coronel.  

- Onde está Felicia Hardy?  

- A caminho.  

- E a criança?  

- Surpreendentemente, sadia.  

- É um menino?  

- Sim, senhor.   

Fury não consegue esconder o discreto sorriso.   

- Ela está bem amparada aqui?  

- Com certeza.   

A porta é aberta e Felicia adentra, com o neném no colo.   

- Nick! – e o abraça, cuidadosamente.  

- Como está, Felicia?  

- Entediada. Mas muito feliz.  

- Precisamos conversar...  

- Muitas novidades e...  

- ... a sós.   

Hicks olha com reprovação e Felicia sente o peso ao ter sua frase interrompida.   

- Se precisarem de qualquer coisa, estarei à disposição. – e sai da sala.   

Nick Fury se comunica com a escolta, avisando que ninguém pode entrar na Sala.   

- Pronto, Felicia. Como você está, de verdade?  

- Confusa. Eu... eu quero falar contigo sobre algumas coisas.  

- Não tenho muito tempo.  

- Eu acessei uns arquivos da S.H.I.E.L.D....  

- Felicia, mais cedo ou mais tarde você ficaria sabendo mesmo...  

- Do que está falando?  

- Eu não estou mais no comando da S.H.I.E.L.D.. Essa é uma informação sigilosa.  

- Como assim? Mas você...?  

- Ninguém sabe, por isso que eu “ainda sou o chefe”.  

- Nem por isso vai poder me ajudar?  

- Desculpe, mas não posso te ajudar duas vezes... no mesmo momento.   

Apesar da sinceridade, as palavras atingiram em cheio o coração esperançoso e perdido da Gata Negra. Ela buscava apoio...   

- O fato de adotar seu filho com o Homem-Aranha já me é de muita responsabilidade. Interferir em assuntos internos só irá piorar as coisas.  

- Mas foram informações a respeito de meu pai!  

- Seu pai? Felicia, ele está morto. De que adianta ficar revirando o passado? Você deve se preocupar com o que irá fazer da sai vida. Peter já sabe do filho que tem?   

Ela olha pro teto.   

- Você deve ter consciência das consequências...  

- Sem sermões.  

- Sem sermões. Cuidarei do seu filho como se fosse meu, mas você está ciente de que...   

Lágrimas começam a rolar dos olhos de Felicia.   

- Sei sim. Ele nunca saberá quem são seus verdadeiros pais.  

- “Nunca” é muito tempo. Mas vocês dois não poderão se aproximar dele por enquanto.  

- Por isso que o Aranha não pode saber. Ele vai querer assumir a criança. Daí você imagina a confusão.  

- A única confusão que imagino é vocês dois brigando pela Times Square novamente, com ele te culpando por ter escondido uma gestação.  

- Tenho que arrancar Peter do meu coração de vez!  

- Se acha que essa é a forma ideal...  

- Nós falamos sobre isso já, e você concordou comigo! Se eu aparecer com um filho... todos vão desconfiar do provável pai!  

- Entendo. Apenas quero que você esteja completamente convencida de que é o melhor a ser feito.   

Felicia olha o filho. Carinho. Ternura. O beija à testa. Sussurra que o ama. E entrega a criança nos braços do coronel.   

S.H.I.E.L.D., Sala de Treinamento

A bola de basquete toca o chão, fazendo um ruído irritante. Uma mão tenta acertá-la na cesta. Em meio a essas tentativas, a outra mão saca um celular.   

- Sou eu.  

- Como estão as coisas por aí?

- O coronel está aqui. Preciso encerrar meu trabalho ainda hoje.  

- Não se preocupe, Hicks. Mais tarde lhe darei as coordenadas.

- Mais tarde? Preciso dessas coordenadas agora, Silver Sable! Tenho que sair daqui! Tenho que aproveitar que Nick Fury está ocupado com Felicia.  

- Mais tarde, Hicks, você irá receber uma ligação de um contato, para pegar seu pagamento.

A ligação é encerrada.   

- Merda!   

Sam Hicks arremessa a bola do centro da quadra. Enquanto ela viaja até o alvo, ele pensa no dinheiro que vai ganhar.   

A bola bate no aro.   

E cai fora da cesta.   

- Que azar!

S.H.I.E.L.D., Sala de Comunicações

As duas mulheres caminham esnobes. Com expressões de dever cumprido estampadas na face. Os agentes percebem tamanha superioridade, que, de tanto irradiar, incomoda.   

- Vamos finalizar logo o relatório...  

- Sim. E avisar pro mala do Hicks que temos uma surpresa para... – ao abrirem a porta, as duas se assustam, ao verem Nick Fury sentado, com as mãos cruzadas, olhando para elas.  

- Olá, agentes!  

Carol e Julia sorriem.   

- Coronel! Que prazer!  

- Uma honra, coronel Fury!  

- Sentem-se.   

Todos acomodados.   

- Vocês me parecem... felizes?!  

- Sim, coronel. Fomos levar notícias do filho de Felicia para a senhora Hardy e tivemos uma surpresa lá.  

- Verdade. Impedimos que Venom a matasse. Tivemos a nossa revanche.  

- Incrível. E onde ele está agora?  

- Em péssimo estado, numa cela especial daqui do edifício mesmo.  

- Hum. Sam Hicks deve providenciar a transferência dele. Esta célula não tem estrutura para deter um vilão como Venom.  

- Não se preocupe, senhor. Eu e Carol demos um jeito nele...   

As duas dão risada.   

- Por isso que quero vocês na minha equipe.  

- Nossa participação é temporária.  

- Infelizmente. Vocês duas são ótimas!   

Elas agradecem com um sinal de cabeça.   

- Quais seus planos, coronel?   

E a conversa durou um bom tempo... 

Bairro industrial, Metrópolis

O quarto já estava desarrumado. Os corpos já estavam vestidos.   

- Você precisa se mudar, Ben. Que mania que os Parkers têm de morar em muquifos!  

- É a grana...  

- É sempre a mesma desculpa!  

- Deixe de ser chata! Me diga, o que pretende fazer?  

- Sei lá. Fury tá na S.H.I.E.L.D., treinando pra ser pai. Eu preciso resolver uma coisa ainda...  

- Que coisa, Fel?  

- Sobre meu pai.  

- Ainda essa história? Por que não esquece isso? Fica aqui comigo. Vamos pra outra cidade, criamos novas identidades e formamos uma dupla!  

- Gostou de agir do meu lado, né?  

- Agora chama assim, é?   

Risos.   

- Seu pervertido!  

- Sério! Pensa no futuro, Fel! A gente se dá tão bem...  

- Desculpa, mas você sempre soube... que você era meu suporte.  

- Eu sei. Uma espécie de consolo.  

- Ah, sem dramas, Ben! Vivemos uma casualidade!  

- E vai me deixar!  

- Bobo! Tome – abre a bolsa – Pra você nunca nos esquecer.  

- Nunca?   

Ele vê a foto. Felicia e o filho.   

- Meu... sobrinho?!  

- Sim. Quer dizer, não mais. Ah sei lá!  

- Felicia... cuidado com o que vai fazer.  

- Você tá parecendo Peter!  

- Eu sou só uma ilusão.  

- Não começa.  

- Promete que vai manter contato?  

- Se você desaparecer, dou um jeito de te encontrar.  

- Mas e se <b>você</b> desaparecer?  

- Relaxa, gatão. Agora tenho que ir.   

Felicia o empurra novamente para a cama, senta sobre ele e o beija ardentemente. 

S.H.I.E.L.D., Sala de Comunicações

Quatro adultos babavam uma criança que, apesar de toda tendência negativa, nasceu saudável e, de acordo com testes preliminares, sem anomalias ou alterações genéticas.   

Desses quatro adultos, Felicia era a menos empolgada. Ela não parava de olhar o relógio digital na parede.   

Rachel entra e a diversão volta a ser o centro das atenções da gatuna.   

Julia e Carol vez ou outra olham, desconfiadas pela angústia da amiga.   

E sem motivo aparente, Felicia se levantou. Caminhou até Rachel, lhe deu um beijo na cabeça. Piscou o olho para Carol e Julia, sorriu para Nick Fury. E olhou para o filho com os olhos cheios de lágrimas.   

- Me deem licença, sim?   

Ao sair da sala, Felicia correu na direção do seu quarto, chorando.   

Rapidamente pega seu uniforme da Gata Negra e o veste. Ao cobri-lo com um sobretudo preto, Carol e Julia a surpreendem.   

- Que pensa que vai fazer?  

- Dar uma volta, meninas.  

- Felicia...  

- Por favor. Vocês não entendem. Preciso de ar.  

- Nós vamos com você.  

- Não. Quero que vocês fiquem do lado do meu filho até que Nick parta com ele. Se Nick for ao banheiro, vocês duas ficam com meu filho. Posso contar com vocês?   

O silêncio.   

- Eu amo vocês. Muito. De verdade.   

Felicia abraça as amigas e corre. Julia a segue e Carol volta ao encontro do coronel.   

Felicia despista Julia, que decide retornar para cuidar da criança.    

Até ela ouvir um cochicho.   

- Tá ok, Silver Sable. Tou posicionado já.   

Julia abre a porta, quase derrubando-a. Hicks se assusta.   

- O que tá planejando?  

- Você entendeu errado!  

- Eu sei o que ouvi!   

Quando Arachne terminou a frase, Hicks se jogou através da janela. A heroína tentou alcançá-lo com teias, mas uma aeronave de resgate já havia concluído a missão.   

Restou a Julia correr ao encontro de Carol.  

E na sala, Nick Fury, Rachel e Carol se assustam com a entrada brusca da amiga.   

- Aconteceu algo muito estranho.  

- Eu já falei o que Felicia fez, Julia.  

- Não! Enquanto eu seguia Felicia, ouvi uma conversa de Hicks... ele tá tramando algo. Quando fui detê-lo, ele fugiu!  

- Fugiu?  

- Sim! Foi resgatado, na verdade.  

- Estamos em perigo. Carol, acione a segurança. Eu vou partir com o bebê.  

- Mas coronel...  

- Não me desaponte. Preciso de vocês. Procurem por Felicia. Varram essa cidade e a encontrem. Vou entrar em contato com a Central para descobrir o paradeiro de Sam Hicks. É o melhor que temos a fazer.  

- Sim senhor!  

- Eu darei notícias. Agora, vão!   

Carol, Julia e Rachel saem apressadas da sala. Nick Fury ajeita a criança, que dorme.   

- Não posso assumir tantas responsabilidades. Vamos embora... meu filho.   

Epílogo 1

A aeronave sobrevoava o Oceano Pacífico, rumo ao sul. Dentro, o piloto, Sam Hicks, e outro homem.   

- Você é meu contato, certo?  

- Correto.  

- Onde está o meu dinheiro?  

- Não quer uma taça de champanhe, agente?  

- Não bebo com quem não conheço.  

- Que nobre. E ao mesmo tempo, tão rude.  

- Apenas quero meu dinheiro e um local seguro para desembarcar.  

- Como Silver Sable havia combinado – entrega uma maleta. Hicks a abre e começa a contar as cédulas.  

- Quanta indelicadeza. Primeiro, negou um brinde. Depois, não confiou na quantia.   

Um tiro. Na testa de Sam Hicks.   

- É isso o que acontece com homens que não honram a presença do Estrangeiro.   

O corpo de Hicks foi arremessado ao mar. A maleta voltou para o dono.

Epílogo 2

A cabeça ainda doía. O enjoo pelo sacolejar, pelo movimento, fez com que aquele corpo se revirasse, incomodado. Uma sensação de azia, mal-estar. A cabeça, sim, ainda doía.   

Os olhos foram abrindo lentamente. A brancura do cômodo onde Felicia estava, junto com a luz fria, deixaram-na cega por alguns minutos. Assim que suas pupilas se normalizaram, a visão ganhou foco.  A cabeça ainda doía.   

Mapeando o aposento, assustou-se. A cama onde deitava tinha sua armação de metal. A única janela existente é de formato circular, e na porta, duas trancas, uma em cima e a outra na parte de baixo.   

Felicia ensaiou se levantar, mas seu corpo estava moído, numa mistura de dor e câimbras. Sentou-se no colchão ortopédico. Suas vestes, brancas, como de pacientes internados. Mas não havia equipamento médico no cômodo. Sua cabeça doía quando ela buscava os pensamentos.   

Então, respirou fundo e se levantou. Apoiando-se na cama e nas paredes geladas, chegou à porta. Com força, destrancou as duas partes, apesar da dificuldade, e quase não teve como abri-la. Era pesada. Chumbo, talvez.   

Ao sair, se surpreendeu com o estreito corredor. A sua direita, não tinha saída, nada. Apenas uma parede. A esquerda dava pra uma escadaria e não havia outros acessos, outros cômodos.   

Arrastando-se, Felicia alcançou os degraus e o corrimão de metal, e subiu. Seus pés descalços absorviam o frio, mas não impediam o ruído de cada passo. Foi assim até encontrar outra porta de chumbo, com duas trancas. Mesmo com a cabeça doendo...   

Abriu sem grandes dificuldades, por ser a segunda em poucos minutos.    

Aí, tudo mudou.   

Lá fora, o vento gélido lhe cortava o corpo coberto apenas por aquela espécie de avental. Os cabelos sacolejavam sem direção real. Seus olhos novamente sofreram o impacto da cegueira temporal. E sua cabeça parou de doer com o que viu: nada.   

Apavorada, pôs-se a correr enquanto raciocinava. Então, travou o corpo ao chegar a uma borda. Ela estava em um navio cargueiro, no meio de algum oceano gelado. Sozinha.   

Abraçou o próprio corpo enquanto olhava para o céu, que começava a ficar escuro. Não ouvia nada, senão ondas se chocando contra o casco da enorme embarcação fantasma.   

Noutra tentativa, buscou lembranças.   

Nada.   

Sentiu algo que não conseguia identificar. Ficou nervosa. Acuada.   

Era desespero. Mas não tinha esse registro. Na verdade, não havia registro algum em seu cérebro.   

De repente passou a admirar o que via. Não caiu nesse sentimento estranho que percorria seu corpo.   

- Você acordou, finalmente...   

Aquela voz...   

- Estava preocupado.   

Felicia se vira e olha quem lhe fala.   

Um homem de uniforme militar, alta patente por tantas medalhas presas, um charuto à boca, na sua mão direita uma garrafa de champanhe e na outra, duas taças vazias.   

- Sente-se melhor?   

Não houve resposta.   

- Demorei tanto tempo para planejar a missão... e você não se lembra de mim?  

- Desculpe... não recordo.  

- Tome – o militar enche uma taça e entrega para Felicia – Seis meses desaparecida, dada como morta. Eu consegui te resgatar, Arma VII.   

Felicia bebe um pouco.   

- Esse é o meu nome?  

- Foi uma missão complicada, mas felizmente você está segura agora. Dentro de alguns dias, vai voltar ao front.  

- O que eu sou?  

- Uma arma.  

- Não me lembro de nada...  

- Não se preocupe. Você está confusa. O único que lhe interessa saber é que você tem de obedecer a mim, o general Lane.  

- Senhor, eu...  

- Acalme-se, Arma VII. Quando chegarmos ao Bunker, vai compreender. Agora, é melhor que volte para a sua cabine. Está frio, anoitecendo... e não quero que minha super-soldado perca todo o processo de recuperação já iniciado.