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Gata Negra #28: Contato Mortal

Gata Negra #28: Contato Mortal

Numa missão arriscada, Felicia vai até Cingapura roubar o computador pessoal de um químico holandês. No caminho, ela se depara com um grande desafio, maior até do que seu confronto com o Aranha: sobreviver à investida de Elektra! E mais: Felicia começa a receber pistas sobre o plano do Camaleão!

Aeroporto particular, NYC, 9:20

Encostados na aeronave, Felicia e Charles aguardam a chegada de uma pessoa. Ele termina de fumar e pisa o cigarro.   

- Não me reprove, Felicia. Eu vou parar com isso um dia.   

- Isso não é um favor que fará para mim, Charlie.   

- Se você me pedir eu largo a nicotina na hora!   

- É uma provocação?   

Ele sorri e se aproxima.   

- Não se anima, Charlie. O que aconteceu entre nós em Londres não vai se repetir.   

- Eu paro de fumar!   

Gargalhadas.   

- Que bom que está animada, Gata Negra – uma voz feminina já identificada pelo casal.   

- Recebi o recado urgente. Tão urgente que nem me arrumei direito, só o tempo de colocar o uniforme nessa bolsa.   

- Preciso de você.   

- Já sei. E imagino que farei outra viagem.   

- Cingapura.   

- Não acredito…  

Felicia não completa a frase porque consegue, de última hora, tirar uma vantagem desta situação: viajar de graça. O fato de estar ajudando alguém não mais lhe motivava como antes. Ainda mais depois do audacioso roubo do museu da SJA. [1]

- O que farei lá?   

- Roubar.   

- Que novidade…  

- Você tem que pegar o palmtop de um químico que está lá em Cingapura.   

- Um palmtop? O que isso tem a ver com diamantes, pedras egípcias e quadros?   

- Não tenho ideia. Tome.   

Julia entrega um envelope.   

- Aí dentro tem as informações necessárias, menos o retrato da vítima.   

- Que ótimo… logo o mais importante!   

Charles entra no avião.   

- Quanto tempo ficarei por lá?   

- Depende de você. Mas acredito que menos de três dias.   

- Julia… eu não posso passar três dias com apenas essa roupa e o uniforme!   

- Eu pensei nisso. Dentro do envelope tem uma boa quantia em dinheiro para despesas diversas.   

Nesta parte da conversa Felicia teve a recaída: fazer trabalhos sem receber algo em troca. A gratidão oferecida pela sua amiga aracnídea não mais era suficiente; tampouco a liberdade prometida pela agente federal Michelle.   

- Notícias de sua filha?   

- Ouvi a voz dela ontem… fico aliviada com cada trabalho que você conclui com sucesso, porque recebo notícias de Rachel. Então… boa viagem, Gata Negra.   

Felicia, ao entrar no avião, olha para trás e vê Julia tentando esconder uma dor nas costas. Ela sacode a cabeça, como se fosse apenas impressão, e adentra à aeronave.   

Cheiro de cigarro.   

- Se eu acreditasse nas suas mentiras… Não o apague, Charlie. O fato de eu estar indo pela primeira vez a Cingapura compensa qualquer mau-humor.   

Lá fora, no pátio, Camaleão volta à sua forma e Bumerangue chega com outros capangas.   

- Preciso de cuidados médicos, Meyer. Esses ferimentos à bala estão me incomodando novamente.   

- Vamos depressa, chefe. Só queria mesmo que o senhor me explicasse o que tem de importante no palmtop do holandês.   

- A conclusão, meu caro. Quando Felicia me trouxer o computador, terei a fórmula para transformar grafita em diamante!   

Cingapura, 16 horas depois

“Era o que eu queria… ficar hospedada aqui… tou me sentindo uma prostituta de beira de estrada… Ah, vai, Fel… Nem é tãããão ruim assim! Eu não posso me expor, mesmo estando do outro lado do mundo. Imagina num hotel luxuoso! Posso cair em tentação e meu trabalho ir por água abaixo…”  

O piloto Charles ficou no aeroporto resolvendo pendências e não ficará no mesmo quartinho de Felicia. Provavelmente ficará lá no galpão, com a nave. Foi uma exigência da ladra…  

“Pois bem… vou comprar algumas roupas… mas antes preciso ir ao hotel onde o tal químico holandês… como é mesmo o nome dele? Ah, Willem Van Dorth. Tenho que ir onde ele se hospedou. Depois penso num plano…”  

Após se perder diversas vezes pelas ruas lotadas, Felicia desistiu de ir às compras e foi para o hotel. Era mais fácil de achar. Como ela não estava vestida como os hóspedes daquela luxuosa instalação, a ladra aproveitou as lojas do quarteirão e fez farra. Além de um vestido de noite, roupas para o dia a dia. Não resistiu e saiu de uma das lojas já produzida.   

“Como é bom gastar o dinheiro dos outros…”  

Agora ela precisava encontrar o químico holandês. Por onde começar?   

“Se eu me informar na recepção, logicamente não me dirão onde ele está…”  

Fingindo estar se atrapalhando com as várias sacolas nas mãos, Felicia, ao encostar-se ao balcão, é socorrida pelo gerente, que estava sozinho naquele pouco movimentado horário.   

- Obrigada… você fala inglês, né?   

- Absolutamente.   

- Bom! Um dos problemas que meu marido enfrenta quando briga comigo é ver os zeros diminuindo da conta bancária…  

O gerente sorri timidamente.   

- Eu sei que é proibido, mas preciso usar o seu computador para acessar nossa conta corrente. Você poderia…  

- Desculpe, senhora – interrompendo – mas não é permitido.   

- É proibido mesmo se eu te oferecer algo em troca? – morde o lábio inferior e suspende as sobrancelhas.   

- Bom… eu…  

Nem mesmo aquele gerente asiático resistiu ao poder da Gata Negra. E olha que não estamos falando do poder de azar…  

- Tome – e coloca um maço de notas altas de dólar no bolso da frente da calça do gerente que, desconcertado, fecha as pernas e se afasta.   

Sem esperar a resposta, Felicia cruza o balcão e chega ao computador.   

- Sabe, o que seria das mulheres sem homens? Dos homens ricos! Esse negócio de amor não existe. Mulher gosta de dinheiro! Joias! Diamantes…  

Falando mais bobagens com o gerente, Felicia consegue descobrir qual é o apartamento onde Willem está hospedado.   

- Maravilha! Ainda tenho muito dinheiro para gastar – aperta o pequeno botão na CPU e o computador é reiniciado.   

Ao passar pelo gerente, Felicia o alisa o queixo, manda beijo e agradece.   

A Gata sai do hotel e do passeio olha para cima, tentando enxergar o quarto do químico. Suas lentes a ajudam muito, inclusive quando revelam que para entrar pela janela será necessária uma descida, a partir do terraço.   

E num terraço do prédio à frente ao hotel, uma mulher de roupa vermelha e cabelos pretos acompanha os passos de Felicia.   

Cingapura, noite

Com o uniforme preto, a Gata se balança por entre os espaçados prédios da cidade, até chegar ao topo do hotel-alvo.   

Alternando o gancho com as garras, Felicia desce com destino ao 28º andar.   

“Se ele fosse mais rico eu não teria tanto problema, já que se hospedaria em um andar mais acima…”  

A bolsa cruzando as costas guardava o vestido novo, um par de sapatos novo, maquiagem nova e uma calcinha. Também nova.   

O quarto.   

O delicioso sorriso da lembrança: abrir uma janela, que, dessa vez, não estava nem trancada nem emperrada.   

“E foi assim que tudo recomeçou… às vezes penso em me arrepender ao ter voltado para Nova York. Penso em me arrepender? Isso existe? Enfim… da mesma forma como aquela cidade me atrai, os problemas me atraem…”  

Ela entra no recinto.   

Tudo escuro e silencioso. As lentes fazem seu trabalho: clarear o ambiente.   

“Não vejo o palmtop por aqui…”  

Com a destreza de felinos, a ladra percorre o grande cômodo.   

“Ele não é tão pobre assim, né? Olha a suíte!”   

Na mesa onde fica o telefone, Felicia vê algo interessante: um bilhete.   

“Hum… um convite dos colegas que também estão na conferência… eles querem que Willem se junte a eles para um drinque no piano-bar do hotel. Nossa, que sorte, pelo recado ele saiu há poucos minutos… Inclusive… esse cheiro… o cheiro dele… o perfume dele é bom…”  

Felicia retira a bolsa das costas.   

“Acabo de ter uma grande ideia! Arriscada, mais excitante!”   

Ela corre ao sanitário.   

“Que banheira enorme! Bom, se vou roubar, por que não fazer, ao menos, cheirosa?”   

Retira o uniforme enquanto a água e o sabão enchem a banheira.   

“Tenho tempo suficiente para uma pequena sessão de relaxamento…”  

Tempo realmente suficiente.   

Após colocar o vestido prateado, de tecido meio emborrachado, com uma generosa fenda lateral na perna esquerda, Felicia guardou o uniforme na bolsa e a escondeu na janela, do lado de fora. As sair do quarto, sobre a mesa de centro, ela avistou seu trunfo: o passaporte de Willem Van Dorth.   

“Pego fácil! Cabeça raspada, cavanhaque… uau! Ahahaha!”   

Esticando o vestido para baixo, Felicia sai do quarto do holandês e se dirige ao piano-bar.   

Da porta, ela apenas observa o ambiente, à procura da vítima.   

O local está muito cheio. As mesas ocupadas, garçons circulam por entre homens de terno e mulheres de longo.   

Ao fundo do salão o pianista dedilha algo norte-americano.   

“Aposto minhas sete vidas como o que ele está tocando é Ray Charles! O terror das mulheres desamparadas que se entregam ao Martini! Falando nisso, preciso me servir…”  

Felicia caminha pelo local, movimentando levemente o quadril, e pega uma taça, que estava na bandeja sobre o balcão, e que seria servida para outra pessoa.   

“Cadê você, holandês…?  

Ela não disfarça que está buscando alguém. Agir dessa maneira tem dois significados: mostra que ela é uma pessoa comum, procurando companhia; e mostra que ela é discreta, afinal, nada mais discreto do que ser uma pessoa comum.   

“Ali está ele…!”  

Felicia vira o conteúdo que estava na taça e se aproxima do pianista, que acabara de encerrar a canção e se dava folga.   

- Você é americano, né?   

- Sim… você também?   

- Não. Eu sou holandesa.   

- Não percebi. Você não tem sotaque.   

- Eu ser holandesa não significa que não moro nos Estados Unidos!   

- Verdade… Me acompanha?   

O pianista serve Felicia de whisky.   

- Eu queria te pedir uma coisa… como é seu nome mesmo?   

- Me chame de Jef. E o seu?   

- Mary Jane. Mas me chame de MJ.   

E assim Felicia gargalhou por dento.   

- Não é nome de holandesa.   

- Como te disse, eu ser holandesa não significa que tenho que ter nome de holandesa. Quer saber a minha história? – e pisca o olho.   

- Não! Diga, MJ… em que posso te ajudar?   

- Meu namorado holandês está ali… com uns amigos. Eu queria fazer uma surpresa pra ele: cantar a nossa música!   

- Não vejo problema nisso. 

- Pode ser agora?   

- Sim!   

- Então, me segue que você se dá bem!   

O pianista dedilha algumas notas e Felicia segura o microfone.   

- Há garotas que nunca têm uma chance / e ainda que elas digam que precisam de mais romance / diamantes e perolas são tudo que algumas garotas conseguem ver / seu beijo é joia para mim / eu sou tipo uma garota de sorte…  

As pessoas por um minuto se calam quando escutam a voz de Felicia. Ela não é uma cantora excepcional, mas suas curvas, seu vestido chamativo e sua performance tiravam qualquer atenção.   

- Eu sou tipo uma garota de sorte / você faz eu me sentir como a única garota no mundo / eu sou tipo uma garota de sorte / você faz amor comigo como se nunca tivesse feito antes / eu vou dar, dar, dar tudo para você…  

Felicia deita sobre o piano e olha o químico. Ele também a encara, boquiaberto. A cada frase ela o olha mais. O holandês se ajeita na cadeira, sendo metralhado pelas palavras e insinuações de Felicia.   

- Agora eu agradeço minhas estrelas da sorte lá em cima / por me darem o melhor de você para amar / no amor e na sorte eu tenho uma garantia / porque tenho você aqui comigo / eu sou tipo uma garota de sorte…  

Encerrando a apresentação, ela senta no piano, de pernas cruzadas. Os cabelos lhe caem os ombros e ela sorri, especialmente para Willem. As pessoas aplaudem, inclusive o pianista, que lhe entrega um cartão.   

Felicia se levanta e segue andando, para a saída, mas passa pela mesa do químico. Ele, sem hesitar, a puxa pelo braço e a convida para sentar. Felicia sorri e aceita o convite.   

A única mulher na mesa se tornava a mais desejada em todo o restaurante.   

- Parabéns pelo show…  

- Bom que tenha gostado.   

- Gostei da letra.   

- Tem algo nela que você possa me oferecer, ou me dizer?   

Willem se ajeita mais na cadeira, e coloca o guardanapo sobre as penas.   

- Está hospedada aqui?   

- Apenas de passagem.   

- E agora?   

- Agora tô livre.   

- Vamos conversar num lugar mais reservado?   

As pessoas à mesa comentam em voz baixa.   

- Depende. – diz a ladra  

- Do que?   

- Diamantes ou pérolas?   

- Eu vou dar, dar, dar tudo para você – cantando como Felicia.   

Felicia passa a mão na cintura.   

- Só se for agora.   

Ele fica em pé e se despede dos amigos. Assim que Felicia se levanta, ela olha para o pianista, que sorri enquanto toca.   

Já no quarto, Willem serve whisky. Felicia senta na cama, e a fina alça esquerda lhe escorre pelo ombro.   

- Eu que sou um cara de sorte…  

Felicia tira os sapatos e se encosta mais na cama.   

- Isso é o que vamos ver…  

Willem entrega o copo e os dois brindam. Ele senta ao seu lado e lhe acaricia as pernas trabalhadas. Felicia sorri.   

- Você me deixou louco, sabia?   

- Eu já ouvi muito essa frase…  

O químico se deita sobre Felicia. O vestido não permite que ele separe um pouco mais as pernas da ladra.   

- Não acha que esse pano tá atrapalhando?   

- Claro… me dá um minuto…  

Felicia se levanta e o joga na cama, em seguida suspende o vestido até os joelhos. Ela senta sobre ele. Na barriga. Ele a empurra mais para baixo. Ela, mexendo os quadris, aceita o movimento forte. Ele sorri e fecha os olhos. Ela pega o lençol que já estava jogando ao chão e amarra os braços do holandês na cabeceira da cama.   

- Huuuuuuum… você é louca…  

- Não, querido… eu sou uma ladra! – e dá um soco no rosto dele, que desmaia – Louca eu seria se transasse com você… apesar de te achar interessante!   

Felicia desarruma a bagagem dele, espalhando tudo pelo chão. Gavetas. Pastas. Até encontrar o palmtop.   

“Tanta coisa por isso… mas o que será que tem aqui dentro?”   

Sem tempo para mais nada, Felicia pega a bolsa que tinha escondido pelo lado de fora da janela e sai correndo do quarto. Ao entrar no elevador, vê os amigos do químico em direção do aposento, recém-saídos do outro elevador.   

“Eles estavam pensando em fazer uma festinha… comigo???? Não sei se fico triste ou…”  

Felicia chega ao terraço. Troca de roupa e coloca o palmtop dentro da bolsa. Ela voltou a ser a Gata Negra de antes.   

A Gata Negra que não media esforços para realizar o assalto.   

Ela não se importa em saber que o roubo não foi uma realização pessoal.   

Ela é uma ladra. Ela é a Gata Negra.   

Mas ela é empurrada pra fora do terraço. A sorte é que o gancho rapidamente foi acionado, e a ladra conseguiu aparar a queda e fugir, sem olhar para trás.   

Só foi parar quando chegou à já deserta rua onde estava hospedada.   

“O que foi aquilo…”  

Agora ela respirava.   

- Você.   

Uma voz feminina, como um sussurro.   

- Gata Negra.   

Como reflexo, as garras acionadas.   

- Quem é você?   

- Seu azar.   

Elektra salta sobre Felicia, com os dois sais. A ladra dá seguidos saltos mortais para trás, mas é atrapalhada pela bolsa que estava nas costas.   

A arma branca rasga as alças da bolsa. Felicia rola pelo chão. Elektra se aproxima, girando os sais.   

- Olha aqui… eu não sei quem é você nem o que você quer comigo…  

- Não perca seu tempo falando, Gata Negra.   

De quatro, Felicia olha com raiva. Sua garganta arde. Ela não sabe do que sua oponente é capaz, mas acredita já ter visto algo sobre ela em algum lugar.   

Elektra salta numa voadora, atinge o ombro direito da Gata, que acabara de se levantar. A ladra se bate contra um muro e fica encostada.   

A ninja corre com os dois sais na mão, na direção de Felicia, para o golpe fatal. Os olhos da gatuna brilham. Na hora do ataque, Felicia salta e os sais ficam cravados na parede. Ao descer do pulo, Felicia fica em pé, sobre as armas brancas. Ela sorri. E chuta o rosto de Elektra. Em seguida salta sobre ela.   

Antes de concluir mais este pulo, a ninja a puxa pelo pé. Felicia cai e bate o rosto no chão. Elektra a pega pelo cabelo e coloca o sai no pescoço da ladra.   

A Gata olha pro lado oposto.   

- Esse truque não vai funcionar comigo.   

- Não é truque! É a mulher que quase me matou!   

- Eu estou quase te matando!   

- Antes… quando eu descobri um plano de um chinês maluco [2]… que envolvia uma mulher, algo como uma arma letal! Me deixa ir!   

- Eu tenho que te matar, Gata Negra. É o meu trabalho. Não sei qual o motivo para dar ouvidos ao que você está me contando.   

- Acredite. Não estou querendo apenas poupar a minha vida. Eu sei do que estou falando!   

A ninja respira rapidamente, quase ofegante. A ponta do sai empurra a pele do pescoço de Felicia. Um pouco mais de força e a Gata terá sua garganta perfurada.   

- O que você viu, ladra?   

- Deixe-me ir atrás dela! É coisa pessoal!   

Felicia continua segurando o pulso de Elektra, empurrado para não ser ferida fatalmente. Seus olhos tremem, as pupilas estão dilatadas; o que é visível mesmo com a pintura nas lentes.   

- Você está dizendo que eu estou envolvida em algo grandioso. Quero saber o que   é!

- Aquela mulher tem a resposta! Deixe-me ir atrás dela!   

O sai é afastado do pescoço, mas em seu lugar, aquela mão com as veias saltando o aperta. Como a Gata não está usando a coleira de espinhos, ela perdeu mais essa defesa...   

Elektra ergue a cabeça de Felicia, que por um minuto respira aliviada. As duas se olham profundamente.    

- Vai ter volta, Gata – e empurra a cabeça da ladra, que, ao bater no piso de concreto, desmaia.   

Em seguida a ninja foi ao encontro de uma mulher oriental, de expressão enigmática, que não lhe revelou o nome, mas é a mesma que deu a ordem para matar a Gata Negra.   

Hotel, Cingapura

Sentada na cama, Felicia faz os curativos que ganhou com esse combate inesperado com a ninja assassina conhecida como Elektra. Ela estava intrigada porque queria entender a relação entre a ninja, a mulher do Templo e, consequentemente, T‘ai Li. Uma nova investida contra orientais não está nos planos de Felicia.   

Ela não quer reencontrar o Justiceiro, muito menos Freeman, o assassino que chora. Até porque todos eles foram os grandes responsáveis por Felicia voltar a ser o que é, e ter o que tem. [3]

A cabeça dela ainda doía por causa da pancada no concreto.   

Ela adormeceu.   

Quando o sol seco de Cingapura esquentou seu rosto, ela bocejou alto e se espreguiçou fortemente. Era um novo dia. Ela estaria disposta a pensar, principalmente quando estivesse voando de volta para a América.   

O susto.   

Ao pé da cama, ensanguentada, estava aquela que há poucas horas queria matá-la.   

Felicia respirou fundo e viu que a ninja não poderia fazer nada de grave contra ela; ela estava muito ferida.   

A Gata a carregou e a colocou na cama. Elektra despertou lentamente.   

A ninja apertava com força uma arma sai, já que a outra parecia danificada.   

Felicia pegou gelo e um copo com água.   

Deitou a cabeça da então ex-inimiga em seu colo e cuidou dela.   

- Eu não sei por qual motivo você me quer morta… Mas não posso deixar que você morra. Eu iria me sentir culpada pro resto da vida.   

- Aquela mulher… que você viu na rua… o que ela…  

- Bom, é uma longa história, e, pelo que vejo, temos tempo…  

Assim Felicia contou para Elektra tudo o que aconteceu no Templo. A luta com T’ai Li, as grades, a mulher que batia o gongo – que soube-se agora que ela é a mesma mulher que contratou a ninja para matar a ladra. Contou sobre o Justiceiro, sobre o assassino mascarado que derrama lágrimas.   

E falou o que mais interessava a ninja: a história escrita em papéis escondidos na Sala Suprema do Templo, sob um pano vermelho: a Arma Letal num combate entre a China e o Japão, o Céu contra o Sol.   

Passadas longas horas de explicações, Elektra falou sobre a joia semicircular japonesa. Felicia disse que ela encontraria a pedra nas mãos de um amigo e lhe passou o endereço. Em troca Elektra decidiu lhe poupar a vida… temporariamente.   

Um pouco mais de tempo depois, Felicia deixou Elektra se recuperando no quartinho de hotel. Rapidamente entrou em contato com Charles e decidiu que enquanto voasse, iria refletir sobre a própria vida.   

Prólogo

- Quem é?   

- Eu preciso falar com Felícia Hardy, agora!   

- Quem está falando?   

- Você é Felícia Hardy?   

- Como conseguiu o número?   

- Srta Hardy, aqui é o Chefe de Polícia Edward Semeghini, polícia de Nova York. Tenho algumas informações que você pode considerar úteis.   

- Escute, eu quero saber...   

- Não se exalte, por favor. Seria bobagem. Eu sei pra quem você trabalha e foi assim que consegui entrar em contato. Essa linha é segura, você não precisa se preocupar. Nós temos um... amigo em comum.   

- O Homem-Aranha!   

- Sim, ele mesmo. Eu... Me sinto em débito com ele, por diversos motivos. O mais recente foi um incidente no prédio da ONU, envolvendo o Secretário Geral. Você deve ter visto algo nos jornais sobre os tumultos, quando tentaram matar Koffi Anan. [4]  

- Sim, eu soube. O que você quer, afinal?   

- Dar um aviso. Quem tentou matar o Secretário Geral foi o Camaleão, um conhecido terrorista que já cruzou o caminho do Aranha algumas vezes. Eu acertei um tiro nele naquele dia, posso ter salvo a vida do seu namorado. Resolvi investigar por conta própria as ligações do Camaleão e acessei meus contatos na CIA e no FBI. É difícil ficar no encalço de alguém que pode mudar de rosto, mas obtive algumas informações... interessantes.   

Felicia pensava em responder, retrucar qualquer coisa, mas sentiu-se desarmada quando Semeghini referiu-se ao Aranha como “seu namorado”. Parecia inevitável que ele assombrasse sua vida. Será que era assim que ele se sentia também?   

Quando parecia tão perto de esquecer, o passado voltava com a força de um...   

Tiro?   

- Srta Hardy, ouça bem. Eu acho que você pode estar em perigo. Ele... está planejando alguma coisa grande. Tem a ver com os diamantes que você está atrás. Eu não consigo deixar de pensar que esse psicopata vai tentar matar você, mais cedo ou mais tarde. O Camaleão tem contatos no submundo, terroristas, contrabandistas... Ele esteve seguindo seus passos. O FBI teve muito trabalho, mas oficialmente você não é uma deles. Eles não podem proteger você sem levantar suspeitas ou iniciar uma auditoria interna. Não sei o que ele pretende, o FBI não vai me dizer o que você está fazendo na folha de pagamento deles, mas eu já encontrei o Camaleão uma vez e, acredite, é uma experiência que eu não gostaria que se repetisse. Infelizmente, não tenho como falar com o Aranha tão facilmente quanto com você... Então, se você pudesse avisá-lo...   

Ela continuava em silêncio, pensando no significado de tudo aquilo. O Camaleão? Por que aqui? Por que agora? E o que esse policial esperava conseguir dando esse “aviso”? Desde quando esse pessoal ajuda os outros a troco de nada?   

- Srta Hardy?   

- Eu... Eu estou aqui... Acho... Acho que sei como você pode contatar o Aranha. Mas preciso que você faça um favor para mim.   

- Um favor?   

- Não é nada complicado... Escute, é importante pra mim. Eu estou cheia de ter um mundo de segredos e mistérios ao meu redor e não poder fazer nada para controlar isso. Tem uma pessoa... Um “amigo comum”, como você disse. Eu o prejudiquei uma vez. Ajude-o. Ele pode ajudá-lo a contatar o Aranha.   

- De quem estamos falando?   

- O nome dele é Peter Parker. Ele era cientista da UES, mas perdeu o emprego recentemente, por causa de algo que eu fiz. Eu... Olha, eu prefiro que ele não saiba que foi ideia minha, tudo bem? Fica difícil para um nerd se colocar no lugar de alguém como eu ou o Aranha…  

- Imagino…  

- Talvez… Olha, ele é bom nisso… Talvez ele pudesse trabalhar na polícia, como cientista forense. Ele… é boa pessoa. E tenho certeza que vai ajudá-lo a encontrar o Aranha.   

- Bom, eu não tenho como garantir que…  

- Eu sei, eu sei! Escute… Peter vai ajudá-lo, independente do que... Olha, eu só queria…Que ele não soubesse…  

- Srta Hardy, no momento eu estou mais preocupado com a sua segurança. O FBI não vai lhe dar cobertura. Eu vou falar com Parker, fique tranquila. Obrigado.   

Semeghini desligou o telefone, deixando uma melancólica Felicia Hardy se perguntando que mundo era aquele onde tudo parecia retornar para o lugar de onde mais queremos fugir…  

***

Notas:

[1] Confira o roubo ao Museu da Sociedade da Justiça protagonizado pela Gata, na edição anterior, 27, de Gata Negra, aqui no CaldeiraMundi!

[2] Está saga pode ser conferida em Gata Negra #2, quando ela vai para ChinaTown. Lá ela quase morre nas mãos de T’ai Li.

[3] Crossover Gata Negra e Justiceiro aconteceu no extinto site Quadrim! Nas edições 35, 36 e 37 do Justiceiro e as edições 17 e 18 da Gata Negra (infelizmente, não tenho essas estórias porque foram escritas por outra pessoa).    

[4] Todo o atentado você pode ler em Homem-Aranha, edições 36 e 37 (também publicadas na Quadrim). 

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