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Hera Venenosa #05 - Suspiros

Hera Venenosa #05 – Suspiros




Universidade de Seattle, anos atrás


Todo começo é intimidante. Ainda mais quando se começa sem apoio. 


Ao ingressar no campus, Pamela percebeu que realmente biologia era, ignorando a expressão, a sua vida.


Seu exemplo maior: sua mãe; quem sempre lutou pela preservação da vida. Independente da vida que se fale.


E a extensão em botânica era seu maior sonho.


Foi assim que ela adentrou nas enormes instalações da Universidade: de cabeça erguida, peito cheio de coragem, e cabeça a mil.


Até cruzar a grande porta e se assustar com a movimentação de alunos, professores, funcionários e visitantes.


Novamente arqueou o corpo, olhar cabisbaixo. Voltou a ser aquela em que ninguém prestava atenção. Aquela de andar rápido, com os livros e mapa da instituição junto ao corpo.


No meio das andanças, em busca da sala certa da sua primeira aula, viu algo que lhe fez tremer. Fez seu coração palpitar sem compasso. Fez seu estômago revirar. 


Fez muitas coisas passarem por sua mente.


Muitos “se”, muitos “será”, muitos “por que não?”.


Ela viu todas as fichas no que se refere ao amor, novamente, na mesa das apostas.


Lá estava ele.


Tom.


Com aqueles cabelos negros, olhos claros.


“Lindo”, pensava ela.


Corpo bem trabalhado.


“Ele era gordinho”, ria ela, em pensamentos.


Ela suspirou alto, quase chamando a atenção de quem passava ao lado.


Ensaiou passos para chegar mais perto. Cumprimentá-lo, talvez.


Buscou algum conselho sobre amor que tenha recebido. Conselhos sobre como agir nessas horas.


E nem seu diário de infância, onde estavam escritos seus maiores receios e sonhos, tinha tais sugestões.


Enquanto olhava para seu amigo-amor, viu que ele, de repente, ficou sozinho, apoiado no armário, exibindo os bíceps.


Caminhou lentamente, sentindo formigamento por todo o corpo.


- Oi... Tom. – e perdeu a voz.


Ele se virou. Olhou sério. Sem expressão alguma.


- Sou eu... Pamela... – a rouquidão.


Um olhar cerrado. A mão direita coçando a cabeça, ressaltando os músculos.


- Éramos vizinhos e...
- Tom! – uma voz estridente ecoa pelo corredor – Vamos!


Aquela loira de cintura fina. Roupa de cheerleaders, cabelos escorridos.


- Vamos logo porque... – uma virada de olhar – Quem é essa daí? Você está louco? 


Pamela novamente abaixa a cabeça. Tom beija a moça à boca, a pega pelo quadril e dá as costas.


A ela restou sentir novamente o frio na barriga... pela humilhação.


Dos olhos, lágrimas.


O soluço, sim, era escutado.


- Ih, seu primeiro dia e você já está apaixonada pelo capitão do time de futebol americano?
- Hein?


O tremelique facial pós-choro deu lugar a um diálogo.


- Olá, sou Mariah, estudo biologia aqui. Pelo que você carrega, devemos ser colegas em alguma matéria. Seu nome?
- Pamela...
- Prazer. Vem comigo. Não deixe que Tom e Jennifer estraguem seu primeiro dia aqui na universidade. 


Mariah a puxou pelo braço e as duas correram na direção de uma sala qualquer.


E a partir disso, o que parecia improvável, impossível, aconteceu.


Pamela tinha uma amiga.


Juntas, deram um jeito de dividir o mesmo quarto nas imediações dos campi. 


E o tempo assim foi passando...


Ela conheceu os dissabores de ser sozinha até mesmo na universidade.


Era do quarto para as aulas, ou para a biblioteca, ou laboratório.


Estudava para tirar Tom da cabeça.


E quando se esbarravam pelo corredor, ele a desprezava. E os amigos dele a ignoravam, fazendo piadas sobre as roupas, estilo, jeito...


Mariah, a biologia e sua mãe eram as forças que Pam precisava para seguir viva.


Assim o tempo passou...


E com ele, veio o campeonato de futebol americano. Pam tinha como admirar seu amado.


Ela acompanhava todas as partidas, alternando, claro, os estudos e os sonhos.


Chegou o dia de outro jogo.


Mas esse seria o primeiro grande evento social que Pamela participaria desde que ingressou na Universidade.


Mesmo sendo um jogo. 


Não qualquer um. 


A final do campeonato.


E, sentadas na arquibancada, Pamela e Mariah se deslumbravam com os fogos de artifícios, a música animada e a coreografia das líderes de torcida. 


- Não podemos negar... elas são lindas!


Comentavam com uma pontinha de inveja.


As acrobacias deram lugar à entrada imponente do time da casa, muitíssima festejada.


Durante a apresentação da equipe e de todo o período da partida, Pamela vibrava, encantada, com Tom.


Findo o jogo. A vitória. Recebimento de troféus, medalhas, folia. As duas desceram, levadas pela multidão insana.


Então o momento único. Tom olhou para Pamela, sorriu e piscou o olho.


Por reflexo, ela escondeu o rosto e sumiu, ao correr para longe.


Quase cantarolando, passou pelos jardins. Se sentia uma criança, ou, até mesmo, alguma princesa daqueles desenhos animados mágicos, que acabavam de descobrir o amor. 


Seus pelos estavam arrepiados.


No momento em que cheirava uma perfumada flor, tomou um susto:


- Amiga! Se prepare! Fomos convidadas para a festa em comemoração à vitória! Vamos para casa mudar de roupa!
- Não... eu não vou. – uma resposta seca.
- Como não? Sabe quem falou comigo, nos convidando? Tom!


Um novo suspiro acompanhado pelos arrepios.


No quarto...


- Mas eu não tenho roupa, Mariah. Nunca fui a uma festa!
- Deixa de frescura. Temos tempo para uma superprodução! E pode me chamar de fada-madrinha!


Assim foi dado início ao processo de transformação.


- Pamela, precisamos lavar esse seu cabelo.


O que foi seguido por uma máscara capilar, hidratação, produtos para dar brilho e leveza. E, claro, a boa e velha escova para deixar os cabelos escorridos.


No banho, a touca na cabeça.


- Vamos logo, Pam!


Saiu do banheiro enrolada. Totalmente coberta.


- Experimenta esse vestido. Tira a toalha. Pega essa calcinha aqui... bem diferente das suas, que mais parecem de sua avó!


Uma expressão de negação.


- Anda! Tira! – Mariah puxou o pano felpudo, revelando um corpo nunca visto antes por outrem.
- Meu Deus do céu! Você é... perfeita! Olha esses peitos! – e tocou-os – E essa cintura? Pam, que quadril é esse? E suas pernas? Como você consegue esconder...?
- Mariah, por favor...
- Bom, mas antes precisamos aparar umas coisas, né?


Risos.


A mutação seguia a passos lentos.


- Agora põe o vestido verde. Vai combinar com seu tom de pele e com seus cabelos.
- Mas é muito curto... e justo...!
- Desencana, Pam. Hoje vai arrasar!
- Só que Tom tem namorada!
- Existem caras melhores do que ele, sabia?


Ficou pronta e se olhou no espelho.


- Pareço uma garota de programa.
- Esse vestido é meu, sabia?
- Desculpa, não quis ofender, é que...
- Fica quieta. Hora da maquiagem.


Seus lábios tornaram-se carnudos e sedutores. As sombras deram um ar misterioso ao olhar. Tudo se completava naquele rosto agora pintado.


- E o perfume...
- Não uso perfumes. Meu pai disse que eu tenho alergia.
- Isso não existe! Ao menos eu acho... – borrifou o aroma – Viu? Não está empolada, nem coça, né?
- Mas eu...


“Eu acabo de descobrir que ele não me queria vaidosa...”


- Que cheiro bom, Mariah!
- Sim, é uma mistura de jasmim e patchuli, com gotas cítricas.
- Muito bom mesmo!
- Dizem que possui feromônios...


Gargalhadas. 


- Amiga, se eu fosse homem... ou lésbica... te agarraria hoje!


Assim que Mariah se arrumou, as duas partiram para a casa onde estava acontecendo a festa.


E da entrada já se escutava a música alta e a gritaria, consequência da bebedeira.


De mãos dadas, caminharam, sem serem notadas.


Até cruzarem à porta de acesso e chegarem à sala.


Foi quando todos pararam e olharam para Pamela. 


Incrédulos.


- Eu vou embora – cochichou no ouvido.
- Não!


Quando Pam se virou para sair, sentiu alguém lhe puxando pelo braço.


- Você está tão linda quanto quando te beijei na porta de sua casa.


Susto. Emoção.


- Na verdade foi você quem me beijou, mas isso não importa. Tudo bem?
- Oi... Tom... parabéns pela... er... vitória.
- Vamos beber por isso!
- Eu não bebo, Tom...
- Ah, qual é? Hoje é um dia especial! Venci e te reencontrei!
- Por que não falou comigo antes? Há quase um ano estudamos na mesma...
- Psiu! Vamos nos divertir!


Tom enlaçou Pam pela cintura e, acompanhando o ritmo da música, foram até a cozinha. Ao fundo, Mariah sorria, segurando um copo de cerveja. Vazio.


- Então, Tom, com estão seus pais? O que você vai fazer quando se formar? 
- Não falemos de assuntos chatos. Tome!
- O que é isso?
- Tequila!
- Nunca bebi!
- Vai, coragem!


Pamela vira o copo. Tosse. A garganta queima.


- Meu Deus, é muito forte!
- Se quiser pode colocar sal e limão para amenizar a ardência!


Ela apenas sorriu. E esticou o braço. E o copo vazio tornou-se cheio.


Os dois já estavam sentados no chão, rindo. Estavam próximos...


- Não me sinto bem...
- Quer deitar um pouco?
- Não seria pior? Eu sou bióloga e...
- Que nada. Você não entende nada de porre! Vem comigo!


De braços cruzados, eles subiram as escadas e entraram num quarto. Ao tempo em que Pamela se jogava na cama, Tom trancava a porta.


- Tome! – e enche o copo.
- Estou tontinha...
- É assim mesmo quando se bebe pela primeira vez...


Tom senta ao lado dela.


- Senti saudades suas.
- Você me disse que escreveria sempre...
- Não discute comigo.


E Pam o beijou, segurando-lhe com força.


Voltaram a beber.


- Melhor eu parar, Tom...
- Não, relaxa! Tou aqui com você. – se levanta e apaga a luz.


Novos sentimentos despertam. Ou novos sentidos se aguçam. A música ao fundo. A escuridão. O álcool lhe percorrendo as veias. Os lábios dormentes.


Tom a beijou. Um beijo demorado. Seu corpo não mais respondia os seus comandos. Tudo estava misturado: amor, tequila, desejo, medo, descoberta, ansiedade, tesão. 


O beijo tornou-se corpos cobertos apenas por peças íntimas e as mãos percorriam todas as regiões.


- Tom... pare... nunca fiz isso...
- Sério?
- Sim... pare... por... favor...
- Eu vou cuidar bem de você... não farei nada que não queira...


Ela sorriu. Ele a despiu.


- Me dê a sua mão.
- O que é isso?
- É o tamanho do meu amor por você.
- É quente também... – e riu baixinho, envergonhada.
- Deixa eu te fazer mulher, Pam...


Delicadamente os dedos de Tom deslizaram pela cintura até alcançarem a calcinha. Puxando-a, logo não mais protegia aquele corpo.


Ele se colocou sobre ela, afastando-lhe as pernas lisas, torneadas e trêmulas.


- Eu te amo, Pam!


A cada movimento, se ouvia os gemidos e os reclames de dor.


- Relaxa que você vai se acostumar... assim... rebola um pouco...


Os corpos suados. Colados. As costas de Tom estavam arranhadas. A orelha direita, mordida.


Pamela conhecera um novo mundo. O prazer. O clímax. Conhecera o que é ser possuída. O que é um orgasmo ao ter alguém dentro dela. Jurando amor. Levando-lhe ao êxtase.


- Pam, meu amor, eu não vou segurar por muito tempo...
- O... que... faremos...?
- Estou sem camisinha... vem cá... senta na cama...


Tom se levantou e ficou de pé, frente a ela.


- Abre a boca e cuidado com os dentes...
- Eu não sei se...
- Assim... devagar... – segurando-a pelos cabelos, ele ditava o ato oral – Eu não aguento mais... que boca gostosa... Eu vou...


A porta do quarto foi aberta.


Enquanto Pamela recebia o sêmen no rosto, a namorada de Tom e o time de futebol americano gritavam e riam.


A boca de Pamela tremia. Ela empurrou Tom, que vibrava com os atletas:


- Eu não prometi que faria isso?! 


Limpando o corpo, enojada, e, principalmente, tirando o que lhe escorria pelo queixo, ela recolheu o que achou da roupa e saiu do quarto.


Nua.


Passou no meio dos convidados, que gritavam elogios e faziam piadas sacanas.


Aos prantos, fugida, distante, encostou-se numa árvore e, tremendo, tentava se recompor.


Ajoelhou e volveu a grama com as mãos. Parva.


Sentiu um salgado nos lábios e, ao passar a língua, descobriu que não se tratava de uma lágrima...

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